Horácio Roque - um grande homem (da banca)

Afável, simples e com pensamento positivo. Era esta a imagem que Horácio Roque dava de si próprio a quem com ele se relacionava. O espírito de aventura fê-lo correr atrás de uma ambição maior do que aquela que a sua terra natal, Oleiros, prometia.
O mais novo de cinco irmãos viajou sozinho para Angola com apenas 14 anos. E desde então o trabalho nunca faltou. Começou nessa altura a desenhar-se uma vida que percorreu continentes e criou um negócio que ainda hoje controla maioritariamente - o Banif. Banco que fez crescer sem querer dar passos maiores que a perna. O balanço foi positivo: "Valeu a pena criar o Banif", foi o título da última entrevista que concedeu ao Expresso, em Setembro de 2008, e onde afirmou que não tinha como obsessão crescer a todo o custo.

O fundador do Banif, em 1988, não era, ao contrário do que muita gente pensa, madeirense. Nasceu em Oleiros, perto de Castelo Branco, e orgulhava-se do mundo agrícola onde nasceu, mas queria mais. Quis o destino e a ambição que o acompanhou na sua caminhada pela vida que saísse da sua aldeia aos 14 anos em direcção a Angola, onde tinha uma irmã. Foram precisos 14 dias para chegar a Angola de barco, com uma paragem na ilha da Madeira, onde fez questão de pisar o chão. Nunca tinha viajado e o mar não se avistava de Oleiros. A sua ligação ao mar começou nessa altura, a caminho de Luanda, onde afirmava ter crescido e vivido a sua juventude. Com 18 anos, quatro anos depois de ter chegado a Angola, criou uma empresa. De 1958 a 1976 ficou por Angola.


Em 1977 rumou de Angola à África do Sul, onde desenvolveu os seus negócios que passavam por assumir participações em empresas de diversos sectores da economia. Três anos depois começou a investir em Portugal. A sua ligação à Madeira resultou da amizade que desenvolveu com Joe Berardo e que o levou a fundar o Banif, com sede no Funchal.
Com amigos em cada porto, Roque gostava de viajar e do social. Não dispensava passar férias com as filhas e netos. O humor e a boa disposição marcavam pontos na vida do empresário e banqueiro. Mesmo quando não estava nos seus melhores dias, uma boa conversa encarregava-se de lhe devolver a boa disposição.
Em 2008 teve um grave problema de coração que, assim que foi detectado, o levou a ser operado de emergência. Mas não esteve muito tempo em recuperação. A sua energia e vontade de viver rapidamente o trouxeram de volta ao activo.
Em Outubro de 2007, em entrevista ao Jornal de Negócios, quando questionado sobre "se tudo desaparecesse, o que gostaria de manter", respondeu: "A casa da aldeia por respeito aos meus pais. Mas se alguma coisa me acontecesse, gostaria de manter a minha saúde física e mental. E a minha capacidade para o optimismo e para me rir de mim próprio". E na derradeira pergunta dessa entrevista "Onde quer ser enterrado?", respondia: "Em parte nenhuma! Não quero morrer!".
                                   Fonte: Jornal Expresso

Saldanha Sanches - uma personalidade com integridade ímpar

Aqui vai a minha forma de celebrar a vida de uma grande pessoa, cuja integridade é ímpar neste país.
 
Expresso publica última crónica de Saldanha Sanches

Os papa-reformas

Saldanha Sanches, fiscalista
17:13 Quinta-feira, 20 de Maio de 2010

De que serve aumentar o IVA ou tributar as mais-valias, se o Estado continua a esbanjar recursos?

Fala-se muito, nos últimos tempos, em medidas para reduzir o défice. Medidas fiscais, diz-se até, de justiça fiscal.
O aumento do IVA é compreensível e mais justificado do que a redução populista nas cadeiras dos bebés ou nos ginásios, que os consumidores nunca sentiram no bolso. Há pouco tempo foi a aprovação da tributação das mais-valias em IRS para acções detidas há mais de doze meses - medida justa, pois a não tributação era uma singularidade portuguesa. Para as acções alienadas antes da entrada em vigor da lei, a tributação é claramente retroactiva. Mas há na Constituição mais princípios do que o princípio muito tropical da não retroactividade da lei fiscal - e a possibilidade financeira de manter o Estado Social é apenas um deles.
Em qualquer caso, a justiça fiscal é uma questão que não se coloca só do lado da receita pública. Receita e despesa são o verso e o anverso do problema da justiça fiscal. É também muito provável que o esforço financeiro venha a atingir a segurança social, as pensões, as reformas.
Ora, de nada serve aumentar o IVA, ou tributar mais-valias, se o Estado continua a esbanjar recursos.
No esbanjadouro são muito claros dois tipos de papa-reformas: as obras públicas desnecessárias e os papa-reformas em sentido próprio.
O Estado (o Governo, o primeiro-ministro) vive agrilhoado a um conjunto de compromissos políticos, arranjinhos, promessas, vassalagens, dívidas que paga periodicamente em quilómetros de auto-estradas, túneis e, agora, em TGV com paragens em todas as estações e apeadeiros do poder local (desenhado em cima do mapa da volta a Portugal em bicicleta). Já todos sabemos que Portugal tem mais quilómetros de auto-estrada do que muitos países mais desenvolvidos, que não fazem sentido muitas dessas estradas e que é um absurdo havê-las sem custos.
O que é uma verdadeira esquizofrenia é que nada se faça neste momento de verdadeiro aperto das finanças públicas. E o discurso da oposição, que defende a suspensão das grandes obras públicas, mais parece um salivar em vésperas de poder, um repto para que se guarde o melhor vinho para depois de eleições - e não uma verdadeira preocupação com as finanças, ou seja, com os contribuintes.
Além das vassalagens, não podemos esquecer os outros papa-reformas, profissionais da acumulação de reformas públicas, semipúblicas e semiprivadas. Basta ver o caso do Banco de Portugal, ou outros menos imorais, que permitem que uma série de cidadãos - gente séria, acima de qualquer suspeita - se alimente vorazmente, em acumulações de pensões, reformas e complementos, que começam a receber em tenra idade. Muitas vezes até com carreiras contributivas virtuais, sem trabalho e com promoções (dizem que para isto são muito boas a Emissora Nacional / RTP e a Carris).
Tudo isto, como sempre, é feito ao abrigo da lei. É que isso dos crimes contra a lei é para os sucateiros. O problema é que a lei que dá é refém dos beneficiários que tiram e da sua ética.